quinta-feira, 19 de abril de 2012

Calvinismo, Luteranismo, Petismo: ideologias revisitadas


Esse post nasceu por sugestão de minha amiga Gislene Appel (http://www.facebook.com/permalink.php?story_fbid=116810275091916&id=1043157391&cmntid=116892878416989&notif_t=comment_mention) que me convidou (na qualidade de, em suas palavras, "especialista em calvinismo") a discutir a reportagem ""Pastor" comete adultério e se justifica com a bíblia"
 (http://www.youtube.com/watch?v=v359a4T7i-w).



Ótima sugestão: não me lembrava que eu já havia sido especialista em alguma coisa... fruto do meu processo de emburrecimento que vem cavalgando a passos largos.

Em primeiro lugar, devo admitir: gostei da criatividade do pastor.

Mas meu foco será a interessante passagem bíblica por ele utilizada: o profeta Oséias escolhido por Deus para se casar com uma mulher que continuaria, após o matrimônio, sua vida sexual de multiparceiros. E ele, Oséias,  não deveria abandonar a mulher, tendo em vista que:
i.  ela um dia se transformaria;
ii. ele também se transformaria nesse processo.

(Uma super lição de misericórdia para judeus e futuros cristãos, islâmicos,  ateus, e fãs de Falcão e Alípio Martins)

Problemas subententidos:

A maioria (se não todos) os sistemas de convivência ditos "perfeitos" (Javismo primitivo, Cristianismo primitivo, Budismo primitivo, o Islã em sua essência fundamental, Calvinismo primitivo,  Luteranismo  primitivo, Socialismo primitivo, o Petismo primitivo) crivavam-se na organicidade das regras do cotidiano baseadas no  amor e/ou misericórdia pelo universo como se é (incluindo Sociedade e Indivíduo, com suas falhas inerentes).

E amar o universo implicaria no (vigilante) apoio mútuo para o desenvoltimento do potencial de cada um. Tratando de Luteranismo e Calvinismo especificamente: ambos concebem, de forma elitista (ainda que includente) indivíduos que empregarão seu ócio e náo-ócio no desenvolvimento intelectual máximo. Tem-se aí a grande revolução cultural luterana: o homem seria obrigado a aprender a ler e a escrever a fim de melhor conhecer a vontade do Senhor revelada nas Escrituras. O calvinismo, seguia a mesma tônica: o homem deveria buscar desenvolver o máximo de seu potencial como ser social - essência que se manteve no modelo politico e social suíço e holandês até hoje).

Assim, os artesões de sistemas que enxergaram, por assim dizer, um mecanismo perfeito para convivência harmônica, a não ser pelo fato de que tal prática de auto-remodelagem não parece aplicável no curto prazo. Os próprios criadores não conseguiram ultrapassar seus instintos fundamentais como indivíduos: Paulo, ultra-machista; Mohamed genial, mas deveras manipulativo; Calvino - pobre moço - consciente da força de sua teologia sistemática, negou a si próprio 20 anos depois pra defender a sua obra. Interessante considerar o quão não-luterano tornou-se Lutero alguns anos pós-Wittenberg, ou o quão não-petista os Petistas se tornaram.

Roupagem nova no mesmo mortal coil. Ao final, a máxima maquiaveliana prevalece sobre a verdade.

E eis o que provavelmente a sabedoria judaica ensina com a passagem de Oséias: alguns elementos da essência humana são deveras mais fortes do que as verdades absolutas - o que inclui o ímpeto sexual incontrolável, a ganância, e assim por diante.

A saída? A adoção de um sistema que encare as falhas humanas como parte da beleza da humanidade, concomitantemente a uma incessante busca em acertar na próxima vez: eis a essência do judaísmo babilônico (o judaísmo pré-babilônico é bárbaro demais para nossos conceitos pós-helênicos), do cristianismo primitivo. É o fundamento do próprio conceito de igreja: um espaço de buscas individuais no qual se diluem as fraquezas individuais para, no longo prazo, atingir-se a estatura do Super Homem de Nietzche.

E o mesmo conceito pode ser encontrado,  teleologicamente, no conceito de Estado de figuras deveras distintas como Hobbes, Hegel, Marx, Foucault, ou no PT pré-Collor.

Importantes esclarecimentos:

1. devido à  (corretíssima) leitura weberiana do calvinismo como espaço de desenvolvimento da prosperidade no âmbito individual, pode-se cair no erro de ler os movimentos pentecostais e neopentecostais como herdeiros das Institutas. Erro crasso cada vez mais comum. Tais igrejas (assim como algumas igrejas Batistas brasileiras) possuem organizacionalmente o poder ultracentralizado na figura do Pastor. O Calvinismo das Institutas (ou seja, pré-1550) foca sua organicidade na  "assembleia dos santos", mediada por um Conselho salvaguardaria seus caros princípios teológicos e buscaria constantemente apurar as regras de convivência. Pastor e assembléis, nesse modelo teriam o importante poder de eventual dissolução do Conselho - eis a semente do  Parlamentarismo.

2. a essência do Calvinismo não está no conceito de Predestinação, mas no conceito de Soberania.

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