terça-feira, 18 de maio de 2010

E o Dio morreu.

Estou de Luto.
Aqueles que me conhecem um pouco mais sabem que possuo muito poucos pudores com relação à vida ou à Dona Morte. Sempre me gabei pelo fato de a ceifa desta digníssima senhora não conseguir me atingir ou abater, nem mesmo através de eu imaginar ou supor a morte das pessoas mais íntimas ou de familiares mais queridos (obviamente isso não é uma virtude, e sim um desvio psicossocial). 
Contudo, talvez algo tenha mudado e eu não tenha percebido (ainda).
Primeiro, a morte do Wander Taffo, fantástico guitarrista (ex Rádio Taxi e co-organizador do FICO - Festival Interno do Objetivo) há uns dois anos atrás me deixa meio down; agora, essa perda traz à tona o mesmo sentimento. 

Talvez seja algo relacionado à música - afinal nesse ínterim eu perdi outras pessoas muito próximas (nem vou comentar aqui o quão próximas para não escandalizar alguns) e nem foi assim tão deprex pra mim. 

Ou talvez seja como meu amigo Daniel comentou: as boas referências estão partindo, e não temos certeza de termos uma boa safra presente ou futura, e isso é de fato preocupante. 
Preocupação essa que me abate também quanto ao futuro Serra-ou-Dilma do Brasil. Comentei sobre isso lá no espaço do Palpiteiro

E falarei mais (possivelmente) no próximo post.

(Para os que viajaram, estou me referindo à morte de Ronnie James Dio, a maior voz do Heavy Metal de todos os tempos - obviamente, afirmarei a mesma coisa quando Bruce Dickinson ou Sebastian Bach forem também bater palma com o capeta).
Olha o homem aí. Feio?

segunda-feira, 10 de maio de 2010

A política de alianças no Parlamento Inglês - Aprendendo com o Brasil

A camarada  Camila bem lembrou  nos comentários do último post : os elementos distintivos da política brasileira e européia são deveras interessantes. Lembrava ela da transparência* da política inglesa quando comparada à tupiniqum. E tais elementos, corroborando seus comentários, fazem toda a diferença.

(*Essa clareza de opiniões é também bastante perceptível na linha editorial dos jornais - por isso ser absolutamente comum por aqui encontrar alguém a comprar mais de um jornal para ler em sua jornada para o trabalho. Sinceramente, não me recordo de tal fenômeno no Brasil tão raramente:-).

Pois bem: veio daí, juntamente com o pedido da minha Editora-Chefe (menos editora e mais chefe) a inspiração para tecer alguns comentários sobre a política de alianças por aqui.

Parte A:  OS FATOS:


1. Brasil

Eleições presidenciais de 2002. Vence um partido historicamente de esquerda, contrariando os interesses da  Veja grande mídia (alguns devem lembrar da charge acima  - ou de outras que possuíam o mesmo teor Vejista, tentando relacionar Lula ao perigo comunista).
Sem maioria parlamentar em um primeiro momento, inicia-se a política de alianças, emblematizada pela distribuição de gabinetes para o corrente período de governo, além de garantia de concessões nas pautas que serão discutidas e votadas em breve.
Surge uma forte aliande entre PMDB e PT - algo totalmente impensável há meros 10 anos atrás. (e o PMDB hoje em dia possui em seu emblema a cor vermelha, em clara alusão a sua pretensa aliança)

 Todos estranham, mas não há nenhum grande manifesto popular, ainda que o haja nas bases internas do PT, ocorrendo - não apenas por essa razão - o surgimento do PSOL, e uma maior visibilidade da cisão (já desenhada e demonstrada há algum tempo) entre as alas mais e menos radicais do partido, além de uma maior pulverização partidária regional (esse fenômeno da pulverização regional da política partidária, na minha opinião, mereceria um estudo mais detalhado - vou encomendar ao meu amigo palpiteiro tal feito).

2. INGLATERRA
Como algum de vocês estão acompanhando, estamos em época de eleições para o Parlamento Inglês. E, pela terceira vez na história recente da Inglaterra (ultimos 500 anos - afinal, estamos falando em Inglaterra) temos um "Hung Parliament" (traduzindo: nenhum partido obteve maioria absoluta - condição sine qua non no Parlamentarismo Clássico, tendo em vista ser o partido majoritário quem indica o Primeiro-Ministro).


*******************************
Celebração do VE Day (VE = victory in Europe), em memória ao fim da II Guerra Mundial. Tradicionalmente, apenas o Primeiro-Ministro ocupa tal espaço nessa tribuna... Perceba o semblante glúteo de Gordon Brown (direita) ao lado de Cameron (Conservative, ao Centro) e Clegg.
*******************************






Os Trabalhistas, até então no poder, ficaram em segundo, e Gordon Brown quebra a etiqueta, não colocando seu cargo à disposicao da Rainha (ou, no mínimo, do Partido). Os Conservadores, vencedores com 36% das cadeiras parlamentares, autoproclamam-se detentores do direito de governar, tendo em vista haver recebido a maioria dos votos  - como já ressaltado no post anterior, os meninos não possuem compromisso com a verdade absoluta - se é que existe V.A. na política.


Enfim: nenhum partido obtém maioria. Para nós brasileiros, é óbvio qual o próximo passo: iniciar a política de alianças, pois todos sabemos que é o único mecanismo para garantir a governabilidade (pelo menos foi assim que aprendemos).


Mas, para os ingleses, nada é assim tão óbvio.

O primeiro grande problema é que, como já dito, os ingleses só viveram o fenômeno de possuir um "Hung Parliament" 2 vezes (sendo que na primeira, em 1885, ainda se tratava do parlamento britânico, o que incluía o ora complicado Irish Party). E assim, eles não estão acostumados com essa coisa de fazer alianças políticas (ontem pela manhã eu assistia na BBC uma entrevista da Editora-Chefe do Independent, um dos mais importantes jornais ingleses, e ela dizia exatamente isso, com uma face deveras perplexa: "a gente não sabe como lidar com isso, não estamos acostumados".)

E, se existe uma coisa que o inglês não sabe lidar, é com a improvisação, elemento este para nós tão natural (estaria eu enganado se dissesse que, de modo geral, nos é mais fácil improvisar do que seguir protocolos?)

Pois bem: Conservadores (os Tories) e Trabalhistas tentam, a todo e qualquer custo, uma aliança com os Liberais-Democratas para formarem um governo de coalisão, garantindo assim maioria no parlamento.

Os conservadores estavam, até ontem, bastante próximos de conseguirem tal acordo. Até que... o inesperado acontece: uma manifestação popular.




Juro pra você que eu chorei ao ver o vídeo acima - e principalmente ao perceber que não era simplesmente uma organização qualquer a protestar organizadamente, mas uma mistura de organizações não-partidárias e indivíduos de expressão semi-anárquica (tolos dos que relacionam anarquismo a baderna ou desorganização), um levante de pessoas que haviam votado em uma proposta política específica, e que não queria agora serem apenas, usando o jargão político inglês,  "meat" - mero enchimento para um pacote de propostas que, de modo geral, eles não concordavam.

Conheço muitos PMDBistas históricos. Vi alguns balbuciarem contra a aliança com o PT, mas nada além de gemidos rotos.
Muitos de meus amigos que votaram no PT demonstraram-se chateados com as alianças estranhas e seu jogo de poder - mas não me recordo de nenhum deles se manifestando pedindo seu voto de volta (perdoe-me se tal frase não fizer sentido por aí - aqui na Inglaterra, ao menos daqui por diante, parece que faz).

Mas o erro deve ser dos ingleses. Espertos somos nós brazucas, que vivemos agora tantas experiências sobre as quais podemos bradar com todo fôlego: "nunca antes na história desse país". Bobinhos, ainda não entenderam que a tônica da política moderna é viver novas experiências. As alianças parecem espúrias, mas a experiência demonstrará que é nada mais são do que as sombras do inferno moderno. Daqui a pouco, estaremos a ouvir também  por aqui o (aí) tão batido refrão "nunca antes na história...". Quando eles crescerem, talvez se tornem como nós - que há 150 anos atrás já havíamos criado nosso próprio modelo de parlamentarismo - às avessas.

Como bem lembrou a Camila nos comentários do último post : existem alguns elementos que diferenciam a política brasileira da européia. E tais elementos, corroborando seus comentários, fazem toda a diferença.

Abração a todos!
André
 P.S.: A próxima imagem é em memória daquela revista que tanto afirmou, há oito anos atrás, que o governo atual faria uma política anti-americana.
 (e não perca de vista a presença do Lincoln, do Amorim e da Dilma)